quinta-feira, 11 de maio de 2017

Tratado - Dia #32L - 3ª Semana


VI. O Magnificat 

255. Sexta Prática. Para agradecer a Deus as graças que
concedeu à Santíssima Virgem, as almas escolhidas dirão
muitas vezes o Magnificat, a exemplo da Bem-aventurada
Maria de Doignies e de vários outros santos. É a única oração
e a única composição da Santíssima Virgem, ou, antes, que
Jesus compôs n'Ela, pois Ele falava pela sua boca. Este é o
maior sacrifício de louvor que Deus recebeu na lei da graça.

Por um lado, é o mais humilde e reconhecido, por outro, o
mais sublime e elevado de todos os cânticos. Há nele mistérios
tão grandes e escondidos que os anjos os ignoram.

Gerson, doutor muito piedoso e sábio, gastou uma parte
da vida a compor tratados, plenos de erudição e piedade,
sobre os mais difíceis temas. Mas foi só depois, no fim da
vida, que empreendeu, a tremer, a explicação do Magnificat,
para assim coroar todas as suas obras. Diz-nos, num volume
in-fólio, que sobre ele compôs, coisas admiráveis do belo e divino
cântico. Entre outras coisas, ele diz que a própria Santíssima
Virgem o recitava muitas vezes, particularmente depois da Sagrada Comunhão, em ação de graças.
O erudito Benzônio, explicando também o Magnificat,
conta muitos milagres operados pela sua virtude. Diz que os
demônios tremem e se põem em fuga quando ouvem as palavras:
“Manifestou o poder do seu braço e confundiu os soberbos
nos pensamentos de seus corações” (Lc 1, 51).

VII. O desprezo do mundo 

256. Sétima prática. Os fiéis servidores de Maria devem desprezar,
odiar e fugir muito do mundo corrupto, e servir-se das
práticas de desprezo do mundo, que indicamos na primeira parte.

Artigo Segundo 

Práticas particulares e interiores para os que desejam vir a ser perfeitos 

257. As práticas exteriores desta Devoção, que acabo de referir,
não devem omitir-se por negligência ou desprezo, na
proporção em que o estado e a condição de cada um o permitem.

Mas além destas práticas exteriores há ainda práticas
interiores, muito santificantes para aqueles que o Espírito Santo
chama a uma alta perfeição. Consistem, numa palavra, em
fazer todas as ações por Maria, com Maria, em Maria e para
Maria, a fim de mais perfeitamente as fazer por Jesus Cristo,
com Jesus Cristo, em Jesus e para Jesus.

I. Fazer tudo por Maria 

258. É necessário fazer todas as ações por meio de Maria, o
que equivale a dizer que devemos obedecer em tudo à
Santíssima Virgem, e conduzir-nos em tudo pelo seu espírito,
que é o Espírito Santo de Deus. “Aqueles que são conduzidos
pelo Espírito de Deus, são filhos de Deus” (Rm 8, 14). Aqueles
que são conduzidos pelo espírito de Maria são filhos de
Maria e, por conseguinte, filhos de Deus, como já mostramos
(nn. 29-30). E entre tantos devotos da Santíssima Virgem, os
devotos verdadeiros e fiéis são somente aqueles que se deixam
conduzir pelo seu espírito. Eu disse que o espírito de
Maria era o Espírito de Deus, porque Ela nunca se conduziu
pelo seu próprio espírito, mas sempre pelo de Deus, o qual
d'Ela tomou posse, de tal modo, que passou a ser o seu próprio
espírito. É por isso que Santo Ambrósio diz: “Que a alma
de Maria esteja em cada um para glorificar o Senhor; que o
espírito de Maria esteja em cada um para se alegrar em
Deus”.

Como é feliz uma alma quando - a exemplo de um bom
irmão jesuíta, chamado Rodriguez e falecido em odor de santidade
- ela é toda governada e possuída pelo espírito de Maria,
que é um espírito suave e forte, zeloso e prudente, humilde,
corajoso, puro e fecundo!

259. A fim de que uma alma se deixe conduzir por este espírito
de Maria é preciso:

1º. Renunciar ao seu próprio espírito, às suas próprias
luzes e vontades antes de fazer qualquer coisa, por exemplo,
antes de fazer oração, de celebrar ou assistir à Santa Missa,
antes de comungar etc. Porque as trevas do nosso espírito
próprio e a malícia da nossa vontade e obras poriam obstáculo
ao santo espírito de Maria, se as seguíssemos, embora nos
parecessem boas.

2º. Entregar-se ao espírito de Maria para ser movida e
conduzida do modo que Ela quiser. Temos de nos pôr e nos
abandonar nas suas mãos virginais, como um instrumento nas
mãos do artífice, como uma cítara nas mãos dum bom músico.

É preciso perder-se e entregar-se a Ela, como uma pedra
que se atira ao mar, o que se faz tão simplesmente, num instante,
por um olhar do espírito, um pequeno movimento da
vontade, ou verbalmente, dizendo por exemplo: “Renuncio a
mim mesmo e dou-me a Vós, ó minha querida mãe!” E ainda
que não se experimente qualquer doçura sensível neste ato de
união, ele não deixa de ser verdadeiro, assim como se alguém
dissesse, o que Deus não permita: “Dou-me ao demônio”; se
o dissesse com sinceridade, embora sem qualquer mudança
sensível, não seria menos realmente do demônio.

3º. Renovar este mesmo ato de oferecimento e de união,
de tempos a tempos, durante a ação ou depois dela. Quanto
mais o repetir tanto mais depressa a alma se santificará e mais
depressa chegará à união com Jesus Cristo, pois esta segue-se
sempre à união com Maria, visto o espírito de Maria ser o de
Jesus.

II. Fazer tudo com Maria 

260. É necessário fazer todas as ações com Maria. Para isso
devemos pôr os olhos n'Ela, em todas as nossas ações, como
no modelo acabado de toda a virtude e perfeição. É o modelo
formado pelo Espírito Santo numa simples criatura, para nós
o imitarmos, na medida das nossas limitadas forças. É preciso,
portanto, que consideremos, em cada ação, o modo com o
qual Maria a fez ou faria se estivesse no nosso lugar.

Para isso devemos examinar e meditar as grandes virtudes
que Ela praticou durante a vida, particularmente:

1º. A sua Fé viva, pela qual acreditou, sem hesitar, na
palavra do anjo. Acreditou fielmente, constantemente, até o pé
da Cruz, no Calvário;

2º. A sua Humildade profunda, que a fez esconder-se,
calar-se, submeter-se a tudo e pôr-se no último lugar;

3º. A sua Pureza toda divina, que não teve nem jamais
terá igual sob o Céu. Enfim, todas as suas demais virtudes (n.108).

Lembremo-nos, torno a repetir, que Maria é a grande
e a única Fôrma de Deus (nn. 218-221), própria para formar
imagens de Deus, facilmente e em pouco tempo. Uma alma
que achou deveras esta Fôrma e n'Ela se perdeu, em breve se
transformará em Jesus Cristo, que este molde representa ao
natural.

III. Fazer tudo em Maria 

261. É necessário fazer todas as ações em Maria. Para bem
compreender esta prática, é preciso saber que a Santíssima
Virgem é o verdadeiro Paraíso Terrestre do Novo Adão, e que
o antigo paraíso não era mais que a sua imagem. Pois há neste
Paraíso Terrestre riquezas, belezas, raridades e doçuras
inexplicáveis, que o Novo Adão, Jesus Cristo, aí deixou. Neste
paraíso Ele achou as suas delícias durante nove meses, operou
as suas maravilhas e ostentou as suas riquezas com a
magnificência de um Deus. Este Lugar Santo não é composto
senão de uma terra virgem e imaculada, da qual foi formado e
se alimentou o Novo Adão, sem qualquer nódoa ou mancha,
pela operação do Espírito Santo que aí habita. É neste Paraíso
Terrestre que está verdadeiramente a árvore da vida, que produziu
Jesus Cristo, o fruto da vida; a árvore da ciência do
bem e do mal, que deu a luz ao mundo. Há neste lugar divino
árvores plantadas pela mão de Deus e regadas com a sua unção
divina, que produziram e produzem ainda, cada dia, frutos
de um sabor divino. Há canteiros esmaltados de belas e
variadas flores de virtudes, exalando aroma que perfuma os
próprios anjos. Há nele prados verdes de esperança, torres
inexpugnáveis de força, casas encantadoras de confiança etc.

A não ser o Espírito Santo, não há quem possa dar a conhecer
a verdade escondida sob estas imagens de coisas materiais.

Respira-se neste lugar o ar puro e incontaminado de pureza;
nele brilha o dia belo e sem mancha da santa humanidade;
irradia o Sol jucundo e sem sombras da Divindade; arde a
fornalha ardente e contínua da Caridade, em que todo ferro
que é lançado abrasa-se, transformando-se em ouro; nele há
um rio de humildade, que brota da Terra, e, dividindo-se em
quatro braços, banha este lugar encantado: são as quatro virtudes
cardeais (Gn 2, 8-10; n. 6).

262. O Espírito Santo, pela boca dos Santos Padres, também
chama a Santíssima Virgem de:

1º. A Porta Oriental, por onde o grande sacerdote Jesus
Cristo entra e sai do mundo (Ez 44, 2-3): Por Ela entrou a
primeira vez, por Ela virá a segunda vez;

2º. O Santuário da Divindade, o Repouso da Trindade
Santíssima, o Trono de Deus, a Cidade de Deus, o Altar de
Deus, o Templo de Deus, o Mundo de Deus. Todos estes diferentes
epítetos e louvores são muito verdadeiros, atendendo
às diversas maravilhas e graças que o Altíssimo operou em
Maria.

Oh! Que riquezas! Oh! Que glória! Oh! Que prazer!
Oh! Que felicidade poder entrar e permanecer em Maria, onde
o Altíssimo colocou o Trono da sua Glória Suprema!

263. Mas como é difícil a pecadores como nós obter permissão
e ter capacidade e luz para entrar neste lugar. Pois é
tão alto e tão santo que é guardado, não por um querubim,
como o antigo Paraíso Terrestre (Gn 3, 24), mas pelo próprio
Espírito Santo, que se tornou seu Senhor absoluto. Por isso
Ele diz a respeito de Maria: “Tu és um jardim fechado, ó
minha irmã e esposa, tu és um jardim fechado e uma fonte
selada” (Ct 4, 12). Maria está fechada e selada. Os miseráveis
filhos de Adão e Eva, expulsos do Paraíso Terrestre,
não podem entrar neste, senão por uma graça particular
do Espírito Santo, graça que devem merecer.

264. Quando, pela fidelidade, se obteve esta insigne graça,
é preciso permanecer no interior de Maria, todo cheio de beleza.
É preciso ficar lá com complacência, descansar em paz,
apoiar-se confiadamente, esconder-se com segurança e perder-se sem reservas. O resultado será que, neste seio virginal:

1º. A alma será nutrida pelo leite da sua graça e da sua
misericórdia maternal;

2º. Será libertada das suas perturbações, temores e escrúpulos;

3º. Estará em segurança contra todos os seus inimigos:
o demônio, o mundo e o pecado, que n'Ela jamais entraram.

Por isso Maria diz: “Os que em mim operam, não pecarão”
(Eclo 24, 30). Isto é, os que em espírito permanecem na
Santíssima Virgem não cometerão pecados consideráveis;

4º. Será formada em Jesus Cristo e Jesus Cristo nela,
Pois o seio de Maria é, como dizem os Santos Padres, a Sala
dos Sacramentos Divinos (n. 248), onde Jesus Cristo e todos
os eleitos foram formados: “Um homem e um homem nasceu
d'Ela” (Sl 86, 5; n. 32).

IV. Fazer tudo para Maria 

265. Devemos, finalmente, fazer todas as ações para Maria.

Pois, visto que nos entregamos totalmente ao seu serviço,
é justo que façamos tudo por Ela, como um criado, um servo,
um escravo. Não que a tomemos como fim último dos nossos
serviços, pois só Jesus Cristo o é. Mas tomamo-la como fim
próximo, como meio misterioso e fácil para ir a Ele.

Como bons servos e escravos, não devemos ficar ociosos,
mas é preciso que, apoiados na sua proteção, empreendamos
e realizemos grandes coisas para esta augusta Soberana.

É preciso defender os Seus privilégios, quando lhos disputam,
e sustentar a sua glória, quando a atacam. É preciso atrair
todo o mundo, se for possível, ao seu serviço, e a esta Verdadeira
e Sólida Devoção. É preciso falar e clamar contra os
que abusam da sua Devoção para ultrajar seu Filho, e, ao
mesmo tempo, estabelecer esta Verdadeira Devoção. É preciso
pretender apenas, como recompensa destes pequenos serviços,
a honra de pertencer a tão amável Princesa, a felicidade
de sermos por Ela unidos a Jesus, seu Filho, com um laço
indissolúvel, no tempo e na eternidade.


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